Em Carolina do Sul as pessoas gostam muito de novelas, filmes e qualquer coisa que "continua..." e substitua uma namorada ou que preencha o vazio imenso de não se fazer mais merda nenhuma da vida.
A senhora Ana está fazendo isso agora, mas ela só assiste por que gosta mesmo, foi criada assistindo novela, ela já nem sabe o que aconteceu mesmo na vida real, e quando fofoca algo na verdade era o que aconteceu na novela, mas ninguém fala isso pra ela com medo de ofender. Já tem seus 60 anos.
- Senhora Ana Senhora Ana... - sussurrou Mateus de sua janela - Nós somos vizinhos á anos e você nunca me convidou para assistir novela com a senhora, que coisa feia senhora Ana.
De repente ouve batidas na porta que recitam uma espécie de cantiga que Mateus ouvira á muito em sua infância.
Ainda com as mãos nos bolsos de sua calça de moletom surrado, olha com o canto dos olhos para a porta, não quer sair da janela, quando as batidas se repetem e o "flash" de sua infância retorna á sua mente.
Ajeita os cabelos, mais curtos dos lados e um pouco mais cheio em cima. Um nariz fino e um pouco grande perto de seus lábios pequenos. Caminha até a porta e á abre.
- Olá senhor Suetam! - disse com um sorriso largo uma linda mulher de cabelos negros e em estilo chanel, perfeitamente acoplado em seu rosto estreito. Sua pele era clara e sem nenhuma imperfeição, seus olhos levemente puxados e grandes, com íris arroxeadas. Entrou sem pedir, Mateus desviou-se e se virou deixando a porta aberta.
- Olá? - perguntou tentando entender algo, fazendo ser notado, o que parecia que não tinha acontecido - Não sou este senhor Sueseiláoquê que você disse.
- É sim, não se deixe levar pelo nome, é só um jeito diferente de pronunciá-lo, venho de um lugar com tradições diferentes das tradições as quais você está acostumado - disse a moça puxando sua camisa para baixo, uma camisa de mangas compridas e de flanela vermelha, preta e xadrez.
Mateus olhou para aquela mulher, de cima á baixo e não entendeu nada do que estava acontecendo.
Franziu as sobrancelhas e fechou os olhos.
Suspirou.
- Olha, eu não sei o que você quer mas...
- Você sabe sim - disse a moça, se aproximando e remexendo suas mãos - Você sabe.
Olhou fixamente nos olhos de Mateus, e ele estremeceu.
Lembrou de uma sonho que se repetia á anos, desde que tinha uns 9 anos, e agora com seus 27 aqueles sonhos ainda se faziam presentes. Eram sonhos sobre uma sala pequena, uma espécie de elevador estranho, o sonho começava com a visão de uma mão abrindo o trinco de uma porta, depois imagens sobre sua infância apareciam, e de repente ele estava de mãos dadas com uma mulher de camisa vermelha, preta e xadrez, um material que lembrava flanela. O sonho terminava pouco tempo antes de conseguir ver o rosto daquela estranha mulher, e antes de acordar sentia um estranha e ótima sensação de que as coisas já não eram mais as mesmas de sempre. E ai acordava.
Agora estava vendo, ali na sua frente, seus olhos tremeram e se arregalaram.
- Lembrou? - disse com voz suave - Sabe Mateus, eu não tenho permissão para vir até aqui, e nem tampouco de te levar comigo, isso que estou fazendo é muito arriscado, mudará todo o curso da história do lugar que venho e do seu também, estou quebrando um código, o mais importante á ser seguido.
- Eu não consigo acreditar - sussurrou Mateus enquanto leva sua mão ao rosto da jovem, passando os dedos por um lado de seu rosto.
Um arrepio.
- Acredite Mateus! - respondeu - Você tem que decidir rápido, quer vir comigo ou quer ficar aqui?
- Quero ir com você - respondeu secamente sem pestanejar, enquanto olhava fixamente dentro de seus olhos.
Uma batida forte na porta de trás, que lembra o som de um rojão, aquele som de portas quando são arrombadas.
- Ingrid! - disse em voz alta e rouca uma voz masculina vindo dos fundos - Eu sei que você está ai, você está ai, precisa voltar de onde veio, aqui não é lugar para você.
Passos.
A moça pega nas mãos de Mateus, entrelaçam os dedos.
- Vamos! Rápido!
Saindo para pela porta da frente junto com Ingrid, Mateus vê uma pequena sala de madeira, de uns dois metros quadrados com um porta na frente. Está bem no meio da rua, e não há carros nem pessoas passando por ali. São umas 6 horas da manhã e o sol começa a deixar o asfalto dourado. Um vento frio passa por ali, e os pássaros "chamam" chuva.
Correm até a sala.
"aquele trinco"
Ingrid abre a porta e os dois entram. A porta se fecha enquanto eles ainda ouvem os berros vindo de dentro da casa chamando pelo nome da moça.
Lado á lado com os dedos entrelaçados e os corações quase pulando de seus peitos.
- Você está pronto?
- Sim, disse Mateus mesmo não estando, mas sentindo um estranha e ótima sensação de que as coisas não seriam mais as mesmas de sempre.
O futuro de todos foi mudado, todas as consequências de todos os atos em todas as dimensões existentes agora são outras, todos viverão um outro futuro, com pessoas que um dia viveriam mas depois desse dia não, dando lugar á outras.
Isso tudo por que a maior dimensão foi mudada, alguém da maior dimensão resolveu sair de lá e interferir na vida de alguém de uma dimensão muito insignificante.
Sabe aquela dúvida que todo mundo tem? Do tipo: Se meu pai não conhecesse minha mãe eu não estaria aqui, não seria eu, eu simplesmente não existiria. E você acaba desistindo de pensar de tão grande e difícil que a questão acaba se tornando. Então, é mais ou menos isso.
Foi uma escolha tola?
Quando se trata de amor nada é tolo.